ENTENDA AS EXPRESSÕES FACIAIS
Os músculos da expressão facial
foram até aqui focalizados pelo aspecto puramente anatômico, mas é
natural que, por suas próprias funções, eles devam ser observados pelo
aspecto dinâmico, sob a regência do nervo facial. Suas contrações
produzem na face variações na forma dos orifícios anatômicos, pregas e
sulcos da pele que alteram a fisionomia e exteriorizam os sentimentos
das pessoas São as manifestações faciais das alterações do
comportamento, a expressão das emoções.
Emoção é um complexo
psicofisiológico cujas reações dependem do sistema nervoso. Quem quer
expressar seus sentimentos pode tentar fazê-lo por meio da fala e de
gestos. Além dessa maneira intencional de se exprimir, há formas
involuntárias de comportamento que revelam o estado emocional que a
pessoa está vivendo. Os estados emocionais estão muito relacionados com
os músculos da face e são por eles externados com grande variedade de
detalhes.
Os músculos faciais não se
movem comandados apenas por uma via motora voluntária (programas motores
conscientes – trato corticonuclear). Eles também se contraem, para
adotar expressões, através de uma via motora involuntária (programas
motores não-conscientes – tratos supra-espinais descendentes e seus
núcleos) acrescentada de um componente cerebelar, que controla o
sinergismo e a harmonia dos músculos. Assim, a expressão, além de
voluntária, pode ser involuntária, natural e espontânea, de mímica
facial. O termo expressão facial fica reservado para a comunicação
volitiva, a especificação de algo para melhor fazê-lo entendido. Um
sorriso, por exemplo, pode ser espontâneo, automático, quando se gosta
de uma piada (via não-consciente), mas pode ser também um sorriso
“social” voluntário, programado (via consciente).
Certos
movimentos expressivos da face como no sorrir, chorar, gritar são
inatos, não são aprendidos. Outros são adquiridos por imitação; cada
pessoa aprende a se comunicar com o seu rosto, socializando as suas
expressões. É em virtude deste aprendizado que crianças podem se parecer
com os pais adotivos ou certas pessoas evidenciam sua condição de
estrangeiras mesmo sem falar. É por isto também que muitos cegos têm uma
face inexpressiva.
Algumas expressões faciais são
muito claras e revelam prontamente o sentimento da pessoa. Outras são
difíceis de ser interpretadas. Na criança, as manifestações expressivas
da face são autênticas, espontâneas e muito acentuadas. Depois ela
aprende a moderar suas expressões. À medida que vai crescendo, a pressão
social a ensina a guardar seus sentimentos para si mesma, reduzindo
assim a movimentação de seus músculos faciais.
As vias
nervosas motoras que controlam a expressão facial, como vimos
anteriormente, apresentam “caminhos” voluntários e involuntários. Quando
sorrimos de forma forçada, por exemplo, utilizamos uma via que não é a
mesma que quando rimos espontaneamente. Isto tem implicações importantes
no estudo criminalístico, já que é possível através do estudo
pormenorizado da expressividade facial avaliar se o indivíduo está
mentindo ou não. Tem implicações também no campo artístico, já que
“escolas” de teatro utilizam este conhecimento para tornar o mais
espontânea possível uma expressão que não é real. Tem, além do mais,
implicações neurológicas. Quando pacientes apresentam a via motora
voluntária da expressão facial lesada, são incapazes de rir de forma
voluntária (forçada), mas não apresentam este problema durante risadas
involuntárias. O contrário também é verdadeiro.
A sutileza da expressão
facial, aliada aos gestos e às posturas corporais, adquire uma
importância muito grande no relacionamento profissional-paciente. Esta
forma impensada de comunicação pode fornecer dados acerca da
personalidade do paciente mais autênticos do que os informados por ele
próprio pela linguagem verbal. O dentista e o fonoaudiólogo devem estar
atentos para a linguagem facial (e para as expressões corporais) do
paciente para melhor analisá-lo consoante a suas tensões, neuroses,
medo, ansiedade ou ainda sua coragem, tranqüilidade, entusiasmo,
sinceridade. Contração muscular exagerada, por exemplo, pode significar
tensão emocional, nervosismo, dor. Um sorriso, um brilho no olhar podem
simbolizar aceitação, aprovação do tratamento recebido e das atenções do
profissional. Um enrugamento da fronte pode ser interpretado como
atenção, interesse ou então como dúvida, preocupação. A verdade é que a
sensibilidade do clínico juntamente com noções que ele possa ter de
psicologia muito o capacita para entender as variações na personalidade e
no comportamento do seu paciente e facilita o estabelecimento de um bom
relacionamento interpessoal.
Deve ter ficado claro que a
expressão e a mímica facial constituem ligações dos caracteres físicos e
psíquicos do homem e que o jogo contrátil dos músculos traduz os seus
próprios sentimentos e emoções num determinado momento. Pode-se então, a
partir de agora, tentar relacionar algumas expressões faciais com
movimentações musculares específicas.
Figuras 1 e 2
A exteriorização da atenção (Fig.
1) afeta às regiões orbital e frontal. O ventre frontal do músculo
occipitofrontal eleva o supercílio e a pálpebra superior (para se ver
melhor), determinando o aparecimento de pregas horizontais na fronte. Os
músculos da mastigação e o músculo orbicular da boca ficam algumas
vezes relaxados, o que permite uma ligeira abertura da boca.
A reflexão e a concentração (Fig.
2) se traduzem pela contração do músculo corrugador do supercílio e em
menor grau do músculo orbicular do olho, originando pregas verticais
entre os supercílios.
A atenção interrogativa,
quando se duvida ou diverge de alguma explicação, por exemplo,
exterioriza-se pela contração de um dos corrugadores do supercílio e
pela contração do frontal do lado oposto.
Ainda em torno das órbitas, em
que se realizam as expressões faciais mais nobres e intelectualizadas,
pode-se vincular a ação do corrugador do supercílio à tradução do esforço, ira, estranheza, dor psíquica. O músculo prócero, cuja ação origina uma prega horizontal abaixo da glabela, manifesta-se nas demonstrações de tenacidade, rudeza e de ameaça e agressão.
Figuras 3 e 4
A surpresa e o espanto (Fig. 3) fazem afastarem-se as rimas bucal e palpebrais por maior ação do frontal e relaxamento dos elevadores da mandíbula. O susto e o medo (Fig. 4) são acentuações das ações musculares que caracterizam a surpresa. Se o medo evolui para terror, pavor,
tem-se então um exagero das mesmas ações, com envolvimento também do
orbicular da boca e do platisma para a contração dos lábios e da pele do
pescoço.
As manifestações da alegria e da dor física exprimidas pelo riso e choro não são ligadas ao intelecto e se desenham na região bucal.
Figuras 5 e 6
No sorriso
(Fig. 5) há uma contração moderada do complexo muscular bucinador,
zigomático maior e risório, dando à boca uma configuração curva, côncava
para cima. No riso (Fig. 6), as comissuras da boca são
levadas mais para cima e para os lados pelo mesmo complexo muscular,
podendo atuar também os músculos zigomático menor, levantador do ângulo
da boca, levantador do lábio superior e da asa do nariz. O sulco
nasolabial fica mais acentuado e as pálpebras aproximam-se. Se o riso
evolui para gargalhada, todos esses músculos se
contraem mais fortemente, acompanhados da contração do orbicular do
olho, a ponto de provocar o aparecimento de “pés-de-galinha” e
transbordamento de lágrimas. Por ação do levantador do lábio superior e
da asa do nariz, as narinas aumentam seu diâmetro transverso.
Figuras 7 e 8
Nas manifestações de sofrimento, tristeza ou dor (Fig.
7) predomina a ação do músculo abaixador do ângulo da boca, que ao
abaixar a comissura da boca dá a ela um aspecto arqueado de concavidade
inferior, e ao sulco nasolabial, um alongamento característico. O sulco
labiomarginal, quando existe, fica mais pronunciado. Pregas verticais
surgem na área da glabela, resultado da movimentação do corrugador do
supercílio. Todos estes caracteres dão à face aquele aspecto “longo”,
comum nas pessoas pessimistas e desanimadas. No pranto ou choro (Fig.
8), a contração enérgica do abaixador do ângulo da boca, auxiliada pela
contração do abaixador do lábio inferior e do mentoniano, traz todo o
complexo muscular inferior da face para baixo, numa acentuação da
expressão anterior. O orbicular do olho aproxima as pálpebras para
completar o quadro.
Figuras 9 e 10
A função abaixadora dos músculos do lábio inferior concorre também para as expressões de desprezo, desdém, enfado, soberba (Fig.
9), nas quais toma parte bem ativa o músculo mentoniano no movimento de
eversão do lábio. Combinadas à ação do platisma, estas contrações
contribuem para as expressões de asco, repugnância. Destas duas últimas participa também o músculo nasal.
Os músculos peribucais isoladamente participam de outras expressões faciais, como é o caso do levantador do lábio superior (menosprezo, suficiência, ameaça), do bucinador unilateral (ironia, zombaria) (Fig. 10) e do orbicular da boca (raiva, ira) (Fig. 11).
Figura 11
Enfim, existe uma enorme
variedade de detalhes na sucessão dinâmica de expressões que a face
assume, concedendo ao indivíduo traços fisionômicos apropriados a cada
situação. Nem sempre é fácil interpretá-los. Essa dificuldade
interpretativa aumenta quando a manifestação do sentimento não é real. É
que o homem aprendeu com a hipocrisia a usar a face como máscara que
oculta seus verdadeiros sentimentos.
Com o avançar da idade, a pele
vai perdendo sua elasticidade e os sulcos transitórios, ocasionados
pela contração muscular, gravam-se definitivamente na face. Os músculos
que mais se contraíram durante a vida poderão deixar esculpidas, na
velhice, faces joviais, tristes, ameaçadoras e com outros traços que
revelam como foi a existência do indivíduo.
Ao se tentar “ler” a
fisionomia das pessoas, deve-se levar em conta que as expressões
dependem muito dos vasos da face (palidez, rubor) e da mobilidade e
brilho dos olhos (considerados a “janela da alma”) e não somente das
contrações musculares.
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